(Diogo Mainardi)
A Pastoral da Pajero
"O padre Júlio Lancellotti ofereceu ao morador de rua que ameaçou denunciá-lo por pedofilia o aluguel de uma casa, uma bicicleta, uma moto, um terreno, uma viagem à praia e uma Mitsubishi Pajero. Bem que poderia estender sua 'amizadeíntima' a todos os moradores de rua da cidade"
O padre Júlio Lancellotti era o coordenador da Pastoral do Povo de Rua. A partir de agora, ele será conhecido também como o coordenador da Pastoral da Mitsubishi Pajero.
Recapitulo. Em meados de 2005, segundo o próprio padre Júlio Lancellotti, um assassino chamado Anderson Batista o acusou de abusar de seu enteado de 8 anos e passou a chantageá-lo com pedidos regulares de dinheiro. Como um Michael Jackson da Mooca, o padre Júlio Lancellotti negou ter abusado do menino. Como um Michael Jackson do Belenzinho, ele preferiu pagar o chantagista mesmo assim. No total, foram mais de 50 000 reais, incluindo o pagamento de vinte parcelas de uma Mitsubishi Pajero.
A polícia terá de esclarecer todos os aspectos do relacionamento do padre Júlio Lancellotti com o chantagista, definido pelo advogado deste último como "amizade íntima". Foi chantagem? Foi presente? A polícia terá de esclarecer igualmente se o dinheiro usado para pagá-lo saiu de suas economias pessoais ou da entidade beneficente que ele dirige. O padre Júlio Lancellotti declarou que pode contar apenas com os 1 000 reais que recebe da Igreja. Mentira. Desde 1975, ele é funcionário contratado da Febem, e continua a ganhar do estado um salário de 2 480 reais. Além disso, a prefeitura repassa mensalmente à sua ONG, Bom Parto, 500 000 reais. É preciso saber se a Mitsubishi Pajero foi comprada com esse dinheiro.
No ano passado, o padre Júlio Lancellotti acusou a prefeitura paulistana de "práticas higienistas", por querer tirar os moradores de rua do centro da cidade, oferecendo-lhes "só um albergue". Pode-se argumentar que o padre Júlio Lancellotti ofereceu ao morador de rua que ameaçou denunciá-lo por pedofilia muito mais do que um albergue. Ofereceu-lhe o aluguel de uma casa, uma bicicleta, uma motocicleta, um terreno, uma viagem à praia e – ei-la – uma Mitsubishi Pajero. Bem que ele poderia estender sua "amizade íntima" a todos os moradores de rua da cidade.
VEJA publicou uma reportagem sobre a disputa entre a prefeitura paulistana e o padre Júlio Lancellotti. Ele chamou a revista de "autoritária". A petista Maria Vitória Benevides foi mais longe – chamou VEJA de "fascistóide". E o Observatório da Imprensa comentou a reportagem num artigo cheio de termos de duplo sentido, cujo significado só agora consegui entender: "o rabo do texto", "erguer o traseiro", "jornalismo de latrina", "o padre Júlio estende a mão", "via inversa", "amante da dialética", "iguaria de fel", "vanguarda do atraso".
O padre Júlio Lancellotti participou de todas as campanhas eleitorais de Lula. Em 2002, ao tratar do problema dos menores abandonados, Lula apresentou a seguinte solução: "Você pega o padre Júlio e bota ele para cuidar de criança, ele vai cuidar melhor do que qualquer aparelho de estado". Dependendo do que a polícia descobrir, talvez não seja uma idéia tão boa assim botar o padre Júlio para cuidar de criança.
(Veja, 24/10/07)
sábado, outubro 20, 2007
sexta-feira, outubro 05, 2007
O discurso de Cícero
O primeiro discurso de Cícero contra Catilina, proferido em 8 de Novembro de 63 a.C. no Templo de Júpiter no monte Capitolino de Roma.
Já não podes viver mais tempo conosco
I
Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda há-de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há-de precipitar a tua audácia sem freio? Nem a guarda do Palatino, nem a ronda nocturna da cidade, nem os temores do povo, nem a afluência de todos os homens de bem, nem este local tão bem protegido para a reunião do Senado, nem o olhar e o aspecto destes senadores, nada disto conseguiu perturbar-te? Não sentes que os teus planos estão à vista de todos? Não vês que a tua conspiração a têm já dominada todos estes que a conhecem? Quem, de entre nós, pensas tu que ignora o que fizeste na noite passada e na precedente, em que local estiveste, a quem convocaste, que deliberações foram as tuas?
Oh tempos, oh costumes! O Senado tem conhecimento destes factos, o cônsul tem-nos diante dos olhos; todavia, este homem continua vivo! Vivo?! Mais ainda, até no Senado ele aparece, toma parte no conselho de Estado, aponta-nos e marca-nos, com o olhar, um a um, para a chacina. E nós, homens valorosos, cuidamos cumprir o nosso dever para com o Estado, se evitamos os dardos da sua loucura. à morte, Catilina, é que tu deverias, há muito, ter sido arrastado por ordem do cônsul; contra ti é que se deveria lançar a ruína que tu, desde há muito tempo, tramas contra todos nós.
Pois não é verdade que uma personagem tão notável. como era Públio Cipião, pontífice máximo. mandou, como simples particular, matar Tibério Graco, que levemente perturbara a constituição do Estado? E Catilina. que anseia por devastar a ferro e fogo a face da terra, haveremos nós, os cônsules, de o suportar toda a vida? E já não falo naqueles casos de outras eras, como o facto de Gaio Servílio Aala ter abatido, por suas próprias mãos, Espúrio Mélio e, que alimentava ideias revolucionárias. Havia, havia outrora nesta República, uma tal disciplina moral que os homens de coragem puniam com mais severos castigos um cidadão perigoso do que o mais implacável dos inimigos. Temos um decreto do Senados contra ti, Catilina, um decreto rigoroso e grave; não é a decisão clara nem a autoridade da Ordem aqui presente que falta à República; nós, digo-o publicamente, nós, os cônsules, é que faltamos.
II
Decidiu um dia o Senado que o cônsul Lúcio Opímio velasse para que a República não sofresse dano algum. Pois nem uma noite passou. Gaio Graco, apesar da sua tão nobre ascendência, de pai, de avô e de seus maiores, foi morto por causa de certas suspeitas de revolta; juntamente com os filhos foi executado Marco Fúlvio, um consular. Com um mesmo decreto do Senado, foi a República confiada aos cônsules Gaio Mário e Lúcio Valério. Acaso adiaram eles mais um dia sequer a pena de morte, por crime de lesa-república, a Lúcio Saturnino, um tribuno da plebe, e a Gaio Servílio, um pretor?
Nós, porém, há já vinte dias que consentimos no enfraquecimento do vigor de decisão destes homens. Temos um destes decretos do Senado, mas está fechado nos arquivos como espada metida em bainha; e, segundo esse decreto senatorial, tu, Catilina, deverias ter sido imediatamente condenado à morte. E eis que continuas vivo, e vivo, não para abdicares da tua audácia, mas para nela te manteres com inteira firmeza. É meu desejo, venerandos senadores, ser clemente; é meu desejo, no meio de tamanhos perigos da República, não parecer indolente; mas já eu próprio de inacção e moleza me acuso.
Há acampamentos em Itália contra o povo romano. estabelecidos nos desfiladeiros da Etrúria, aumenta em cada dia o número dos inimigos; e, no entanto, o general desses acampamentos e o comandante desses inimigos, eis que o vemos no interior das nossas muralhas e dentro do próprio Senado, urdindo a cada instante algum atentado contra a República. Se. neste momento eu te mandar prender, Catilina, se eu decretar a tua morte, o que sobretudo terei de temer, tenho a certeza, é que todos os bons cidadãos me censurem por ter actuado tarde, e não que haja alguém a dizer que usei de crueldade excessiva.
A mim, porém, aquilo que já há muito deveria ter sido feito, fortes razões me levam a não o fazer ainda. Hás-de ser morto, sim, mas só no momento em que já não for possível encontrar-se ninguém tão perverso, tão depravado, tão igual a ti, que não reconheça a inteira justiça desse acto.
Enquanto houver alguém que ouse defender-te, continuarás a viver, e a viver como agora vives, cercado pelas minhas muitas e fiéis guardas, para não poderes sublevar-te contra o Estado. È até os olhos e os ouvidos de muita gente, sem disso te aperceberes, te hão-de espiar e trazer vigiado como até hoje o têm feito.
III
Que há, pois, ó Catilina, que ainda agora possas esperar, se nem a noite com suas trevas pode manter ocultos os teus criminosos conluios, nem uma casa particular pode conter, com suas paredes, os segredos da tua conspiração, se tudo vem à luz do dia, se tudo irrompe em público? É tempo, acredita-me, de mudares essas disposições; desiste das chacinas e dos incêndios. Estás apanhado por todos os lados. Todos os teus planos são para nós mais claros que a luz do dia, e importa que os recordes comigo nesta hora.
Não te lembras de eu dizer no Senado, no dia 12 antes das Calendas de Novembro, que, em dia determinado, dia esse que havia de ser o sexto antes das Calendas de Novembro , haveria de pegar em armas Gaio Mânlio, um lacaio e instrumento da tua audácia? Enganei-me, porventura, ó Catilina, não só quanto a um acontecimento tão importante, tão horroroso e tão incrível, como também. o que é muito mais para admirar, quanto ao próprio dia? Fui eu ainda que disse no Senado teres tu fixado para o dia 5 antes das Calendas de Novembro a chacina da aristocracia. justamente na altura em que muitas das altas personalidades do Estado fugiram de Roma, não tanto por motivo de segurança pessoal, como para reprimirem as tuas maquinações. Serás capaz de negar que nesse mesmo dia, estando tu cercado pelas minhas guardas e pela minha vigilância, te não pudeste insurgir contra a República, quando tu, perante o afastamento dos restantes, dizias no entanto que a morte de quem tinha ficado, que éramos só nós, bastava para te contentar?
Pois quê? Quando tu, nas próprias Calendas de Novembro, estavas plenamente seguro de que tomarias Preneste num ataque nocturno, não deste conta, porventura, de que tinha sido por ordens minhas que aquela colónia fora guarnecida pelos meus destacamentos, sentinelas e rondas nocturnas? Nada fazes, nada intentas, nada imaginas que eu não só não oiça, mas veja e disso tenha pleno conhecimento.
IV
Recorda comigo, por fim, aquela noite famigerada de anteontem e logo verás que eu velo com mais ardor pela segurança do Estado que tu pela sua ruína. Afirmo que tu, na noite anterior a esta, vieste aos Cuteleiros (não vou falar por meias palavras), a casa de Marco Leca, e que no mesmo local se reuniu grande parte dos cúmplices da mesma criminosa loucura. Ousas, porventura, nega-lo? Porque te calas? Se o negas, eu to provarei, pois que vejo aqui presentes no Senado alguns dos que lá estiveram juntamente contigo.
Oh deuses imortais! Em que país do mundo estamos nós, afinal? Que governo é o nosso? Em que cidade vivemos nós? Estão aqui, aqui dentro do nosso número, venerandos senadores, neste Conselho mais sagrado e mais respeitável da face da terra, aqueles que meditam a morte de todos nós, aqueles que trazem no pensamento a destruição desta cidade e até a do mundo inteiro. É a estes que eu, como cônsul, tenho na minha frente e lhes peço conselho acerca dos interesses do Estado, a eles, que deveriam ser passados a fio de espada e que eu nem com a palavra atinjo ainda.
Estiveste, pois, Catilina, em casa de Leca nessa noite; procedeste à partilha das regiões da Itália; determinaste para onde gostarias que cada um partisse; escolheste quem deixarias em Roma, quem levarias contigo; designaste os bairros da cidade destinados a incêndio; afirmaste que, por ti, já estavas disposto a partir; disseste que ainda te demorarias, contudo, um pouco, porque eu continuava vivo. Encontraste dois cavaleiros romanos, para te aliviarem" desta preocupação e se comprometerem a assassinar-me no meu próprio leito nessa mesma noite, pouco antes da alvorada.
Tudo isto eu vim a saber mal tinha ainda sido dissolvida a vossa reunião; guarneci e reforcei a minha casa com mais guardas; e àqueles que tu me enviaras pela manhã para me saudarem, tranquei-lhes a porta quando eles chegaram, a esses mesmos cuja intenção de me visitarem àquela hora eu já havia previamente comunicado a muitas e das mais altas personalidades.
V
Sendo assim, prossegue, Catilina, o caminho encetado; sai da cidade de uma vez para sempre; as portas estão abertas; põe-te a caminho. Há muito que te reclamam como general supremo esses teus acampamentos manlianos. Leva também contigo todos os teus; se não todos, pelo menos o maior número possível. Limpa a cidade. Libertar-me-ás de um grande receio quando entre ti e mim um muro se levantar. Já não podes conviver por mais tempo connosco; não o suporto, não o tolero, não o consinto.
Grande deverá ser o nosso reconhecimento para com os deuses imortais, particularmente para com o próprio Júpiter Estátor aqui presente, o mais antigo protector desta cidade, por tantas vezes termos escapado a esta peste tão abominável, tão horrorosa e tão hostil à República. Nunca mais a suprema segurança do Estado deve ser posta em perigo por causa de um homem apenas. De tantas vezes que tu, Catilina, me armaste ciladas quando eu era cônsul designado, não foi com a guarda pública, mas com os meus próprios meios, que eu procurei defender-me. Quando, por ocasião dos últimos comícios consulares, tu pretendeste matar-me no Campo de Marte, a mim que era cônsul e aos teus competidores, reprimi os teus criminosos intentos com a ajuda e recursos dos amigos, sem proclamar oficialmente o estado de sítio; numa palavra, todas as vezes que me atacaste, foi por mim mesmo que te resisti, muito embora eu visse que a minha morte ficaria ligada a uma grande desgraça do Estado.
Mas agora é a toda a República que tu diriges abertamente o teu ataque; são os templos dos deuses imortais, são as casas da cidade, é a vida de todos os cidadãos, é a Itália inteira, é tudo isto que tu arrastas para a ruína e a devastação. E, uma vez que não ouso ainda pôr em prática o que se imporia em primeiro lugar e que é próprio destes poderes" e da tradição dos nossos maiores, tomarei uma posição mais moderada quanto ao rigor, porém mais útil no que toca à salvação comum. É que, se eu te matar, continuará na República o restante bando dos teus conjurados; mas, se tu saíres, como já há muito te estou convidando, a cidade ficará vazia dos teus sectários, dessa profunda sentina que empesta o Estado.
Então, Catilina, que se passa? Hesitas em fazer por minha ordem o que tu já te dispunhas a realizar por tua livre vontade? É a um inimigo público que o cônsul manda sair da cidade. Perguntas-me se para o exílio? Não to ordeno, mas, se pedes o meu parecer, aconselho-to.
VI
Que há, ó Catilina, que ainda te possa causar prazer nesta cidade, em que não há ninguém, fora desta conjuração de homens depravados, que te não tema, ninguém que te não deteste? Que nódoa de escândalos familiares não foi gravada a fogo na tua. vida? Que ignomínia de vida particular não anda ligada à tua reputação? Que sensualidade esteve longe de teus olhos? Que acção infamante deixaram de perpetrar as tuas mãos algum dia? Que torpeza esteve ausente de todo o teu corpo? Que jovem haverá a quem não tenhas ilaqueado nas seduções da tua imoralidade, guiado o ferro na rebeldia ou o archote. na libertinagem?
Pois quê? Há pouco, quando, com a morte da tua primeira mulher, esvaziaste a tua casa com vista a um novo casamento, não acumulaste ainda sobre este delito um outro atentado inacreditável, que eu não refiro e acho melhor deixar passar em silêncio, para que não conste que nesta cidade se verificou a barbaridade de um crime tamanho, ou que este ficou sem castigo? Nem menciono a perda dos teus haveres, que tu verás todos confiscados nos próximos Idos; refiro-me a factos que dizem respeito não à infâmia pessoal dos teus vícios, não à tua penúria doméstica e à tua má fama, mas, sim, aos superiores interesses do Estado e à vida e segurança de todos nós.
Podes tu, Catilina, sentir prazer na luz deste dia ou no ar deste céu que respiras, ao saberes que ninguém dos presentes desconhece que, na véspera das Calendas de Janeiro", durante o consulado de Lépido e Tulo, te apresentaste armado no local dos comícios do povo; que tinhas um grupo de homens preparado para dar a morte aos cônsules e aos principais da cidade e que não foi nenhuma reconsideração da tua parte nem o teu medo, mas, sim, a deusa Fortuna do povo romano que impediu o crime da tua loucura? E já nem conto pois que não são nem desconhecidos nem poucos os delitos cometidos depois quantas vezes, sendo eu cônsul designado, quantas vezes mesmo durante o meu consulado, me tentaste matar! Quantos golpes, vibrados de tal maneira, que parecia impossível escapar-lhes, eu não evitei com um pequeno desvio ou, como costuma dizer-se, só com o corpo! Nada adiantas, nada consegues, e, contudo, não desistes de tentar e de querer. Quantas vezes já esse punhal de assassino te foi arrancada das mãos! Quantas vezes, por um mero acaso, ele te escapou e caiu aos pés, esse punhal que, sinceramente, não sei em que iniciações mistéricas e a que deus o terás tu consagrado, para julgares necessário cravá-lo no corpo do cônsul.
VII
E agora, que vida é esta que levas? Desejo neste momento falar-te de modo que se veja que não sou movido pelo rancor, que eu te deveria ter, mas por uma compaixão que tu em nada mereces. Entraste há pouco neste Senado. Quem, dentre esta tão vasta assembleia, dentre todos os teus amigos e parentes, te saudou? Se isto, desde que há memória dos homens, a ninguém aconteceu, ainda esperas que te insultem com palavras, quando te encontras esmagado pela pesadíssima condenação do silêncio? E que dizes ao facto de, à tua chegada, esse lugar ter ficado ao abandono, e ao facto de todos os consulares, que tantas vezes figuraram nos teus planos de assassínio, mal te havias sentado a seu lado, terem deixado deserta e vazia essa zona da bancada? Com que coragem, afinal, julgas tu que hás-de suportar tal afronta?
Se os meus escravos me temessem da maneira que todos os teus concidadãos te receiam, eu, por Hércules!, sentir-me-ia compelido a deixar a minha casa; e tu, a esta cidade, não pensas que é teu dever abandoná-la? E se eu me visse, ainda que injustamente, tão gravemente suspeito e detestado pelos meus concidadãos, preferiria ficar privado da sua vista a ser alvo do olhar hostil de toda a gente; e tu, apesar de reconheceres, pela consciência que tens dos teus crimes, que é justo e de há muito merecido o ódio que todos nutrem por ti, estás a hesitar em fugir da vista e da presença de todos aqueles a quem tu atinges na alma e no coração? Se teus pais te temessem e odiassem e tu não os pudesses apaziguar de modo nenhum, retirar-te-ias, penso eu, do seu olhar para outra qualquer parte. Pois agora é a Pátria, mãe comum de todos nós, que te odeia e teme, e sabe que desde há muito não pensas noutra coisa que não seja o seu parricídio; e tu, nem respeitarás a sua autoridade, nem acatarás as suas decisões, nem te assustarás com o seu poder?
Eis que ela a ti se dirige, ó Catilina, e, no seu silêncio, como que fala:
"Há vários anos já que nenhum crime se viu cometido senão por ti; nenhum escândalo, sem ti; só tu cometeste, sem castigo e com toda a liberdade, o assassínio de muitos cidadãos, a opressão e saque dos nossos aliados; só tu te atreveste não só a desprezar, mas até a subverter e a infringir as leis e os tribunais. Esses crimes de outrora, posto que não devessem ter sido suportados, eu os suportei como pude; mas agora, estar eu toda em sobressalto somente por causa de ti, ser Catilina objecto de medo ao mínimo ruído que surja, não se poder descobrir conjura alguma tramada contra mim em que não esteja implicada a tua intenção criminosa, não, isso é que não devo suportar. Por isso, vai-te daqui e afasta de mim este receio; se ele tem fundamento, para eu não andar oprimida; se é ilusório, para eu, enfim, deixar de uma vez esta vida de medo."
VIII
Se tais palavras, como disse, a Pátria te pudesse dirigir, não deveria ela conseguir o seu intento, muito embora não pudesse fazer uso da força?
E que dizer do facto de tu próprio te haveres entregado sob guarda provisória e teres dito, a fim de evitares suspeitas, que desejavas ficar em casa de Mânio Lépido? Como este não te recebeu, até a mim tiveste cara de te dirigir e de me pedir que te guardasse em minha casa. E, como também de mim levaste a resposta de que eu não podia de modo nenhum sentir-me seguro contigo dentro das mesmas paredes, porquanto já eu corria grande perigo pelo facto de estarmos metidos dentro das mesmas muralhas, foste a casa do pretor Quinto Metelo. E, repudiado por ele, imigraste para casa do teu comparsa Marco Metelo, esse grande homem de quem pensaste, claro está, que havia de ser o mais cuidadoso em te guardar, o mais esperto para te vigiar e o mais enérgico para te defender. Mas em que medida parece justo estar afastado da prisão e das cadeias quem se julgou, por si mesmo, digno de detenção? Uma vez que assim é, Catilina, se não és capaz de esperar pela morte de coração resignado. ainda hesitas em partir daqui para outras terras e em entregar ao exílio e à solidão essa vida, subtraindo-a a muitos castigos justos e merecidos?
"Propõe-no ao Senado", dizes tu. É isto, com efeito, o que reclamas, e dizes que, se esta Ordem de senadores vier a decidir que é sua vontade a tua partida para o exílio, estás na disposição de obedecer. Não, não vou propor uma coisa que é contra os meus princípios, mas, sim, farei com que vejas o que estes pensam acerca de ti. Sai de Roma, Catilina; liberta o Estado destas apreensões; parte para o exílio, se é esta a palavra de ordem que esperas. Então? Não vês? Não dás conta do silêncio dos presentes? Se estão calados, é porque consentem. Porque esperas pela autoridade das palavras, quando percebes muito bem pelo seu silêncio o que têm na vontade?
Ora, se eu tivesse dito estas mesmas palavras a um jovem tão cheio de qualidades como Públio Séstio aqui presente, se as tivesse dirigido a Marco Marcelo, varão da mais alta virtude, já o Senado, apesar de eu ser cônsul, teria, com plena justiça, lançado contra mim, neste mesmo templo, a sua força e o seu poder. A teu respeito, porém, Catilina, a sua imobilidade é uma aprovação; o seu consentimento, um decreto; o seu silêncio, um clamor. E não apenas estes aqui presentes, cuja autoridade tens, pelos vistos, em grande estima, mas a vida em vil apreço; também aqueles cavaleiros romanos, homens da maior honestidade e excelência, e os restantes cidadãos tão valorosos que de pé circundam este Senado, e de quem tiveste ensejo, há momentos, de ver não só a afluência, mas até de reconhecer claramente as disposições e ouvir distintamente os clamores. É com dificuldade que desde há muito detenho suas mãos e suas armas aparelhadas contra ti; mas, se abandonares estes sítios que há largo tempo pretendes devastar, é com facilidade que os poderei levar a escoltarem-te até às portas da cidade.
IX
Mas de que servem as minhas palavras? A ti, como pode alguma coisa fazer-te dobrar? Tu, como poderás algum dia corrigir-te? Tu, como tentarás planear alguma fuga? Tu. como podes pensar nalgum exílio? Oxalá os deuses imortais te inspirassem tal propósito, muito embora eu veja que, se tu, apavorado com as minhas palavras, te decidires a partir para o exílio, uma enorme tempestade de ódios ameaça desabar sobre nós, se não no tempo presente, por causa da fresca lembrança dos teus crimes, pelo menos para o futuro. Vale, porém, a pena, desde que essa desgraça seja particular e se não misture com os perigos do Estado. Mas a ti, o que não se deverá exigir é que te afastes dos teus vícios, que alimentes profundo receio dos castigos da lei, que recues perante as conjunturas críticas da República. Nem tu, Caulina, és de molde que a vergonha te afaste da infâmia; ou o medo, do perigo; ou a razão, da loucura. Por isso mesmo, parte, como já tantas vezes te disse, e, se pretendes, conforme apregoas, atear o ódio público contra mim, teu inimigo, avança já direito ao exílio; se o fizeres, muito me custará suportar a censura dos homens; se partires para o exílio por ordem do cônsul, muito me custará sentir o fardo dessa impopularidade. Se, porém, preferes servir o meu prestígio e a minha glória, sai juntamente com o indesejável bando dos celerados, refugia-te junto de Mânlio, convoca os cidadãos perversos, separa-te dos homens de bem, move guerra contra a Pátria, exulta com uma sacrílega revolta de bandidos, para que se veja que não foste expulso por mim para o meio de estranhos, mas, sim, convidado a partir para junto dos teus. De resto, para quê convidar-te a isso, uma vez que tenho conhecimento de que tu enviaste homens à frente para te esperarem armados junto do Fórum de Aurélio, e sei que tu combinaste e fixaste a data com Mânlio, e sei que até enviaste à frente aquela famosa águia de prata", uma águia que, assim o espero, há-de tornar-se ruinosa e fatal para ti e para todos os teus, uma águia à qual esteve levantado em tua casa um criminoso santuário? Como é que tu poderás passar mais tempo sem aquela que costumavas adorar ao partir para a carnificina, tu que tantas vezes fizeste passar essa dextra sacrílega, do seu altar para a chacina de cidadãos?
X
Irás, enfim, de uma vez para sempre, para onde há muito tempo te arrastava essa tua paixão desenfreada. e louca, pois não é pesar o que esta partida te causa, mas um estranho e inacreditável prazer. Foi para semelhante loucura que a natureza te gerou, te preparou a vontade, e o destino te guardou. Tu, não só nunca desejaste o tempo de paz, mas nem sequer uma guerra que não fosse criminosa. Topaste uma corja de bandidos formada de gente perversa, enjeitada não só de toda a sorte, mas até de toda a esperança. Ah! que alegria não experimentarás, com que júbilo não hás-de exultar, com que. prazer tamanho andarás em orgiástico delírio, quando, entre o número tão avultado dos teus, não conheceres nem vires um só homem de bem! Foi por afeição a tal género de vida que se praticaram aquelas tuas proezas de que se fala: permanecer prostrado no chão, ou para espreitar o momento azado para algum atentado contra o pudor, ou mesmo para cometer algum crime; passar as noites em claro lançando armadilhas não só ao sono dos maridos, mas também aos haveres da gente pacífica? Tens aí onde possas ostentar essa tua famosa capacidade em suportar a fome, o frio, a carência de tudo; e em breve perceberás que foi isso que deu cabo de ti.
Quando te rejeitei do consulado, uma coisa consegui pelo menos: que tu antes pudesses atacar a República como exilado do que maltratá-la como cônsul, e que a tua criminosa empresa mais se pudesse chamar uma arruaça de bandidos que uma guerra civil.
XI
E agora, venerandos senadores, a fim de eu poder arredar e esconjurar de. mim uma censura, de certo modo justa, da Pátria, escutai, por favor, com atenção, o que vou dizer, e gravai-o bem fundo no vosso coração e na vossa memória. Porquanto, se a Pátria, que é para mim mais cara que a própria vida, se a Itália inteira, se toda a República me dissesse:
"Que estás tu a fazer, Marco Túlio? Então tu vais consentir que aquele que provaste ser um inimigo público, que tu vês como o futuro comandante de uma revolta, que tu sabes ser esperado como general no acampamento dos inimigos, ser o instigador de um acto criminoso, o cabecilha de uma conspiração, um agitador de escravos e de cidadãos perversos, a esse vais tu deixá-lo partir de tal maneira, que nem parece ter sido por ti expelido para fora da cidade, mas, sim, impelido contra ela? Então, não vais mandar que o ponham a ferros, que o arrastem para a morte, que o imolem no derradeiro suplício?
O que te impede, afinal? Será a tradição dos antigos? Mas nesta República até simples particulares puniram muitíssimas vezes com a morte cidadãos perniciosos. Serão, porventura, as leis que foram propostas acerca do suplício dos cidadãos romanos? Mas nunca., nesta cidade, os que atraiçoaram a Pátria continuaram na posse dos direitos de cidadania. Ou é a impopularidade do futuro que tu receias? Bela maneira essa de agradeceres ao povo romano, ele que te elevou tão cedo ao supremo poder através de todos os graus da magistratura, sendo tu um homem conhecido apenas pela tua pessoa sem nenhuma recomendação de antepassados - se, por causa da impopularidade ou do receio de algum perigo, desprezas a salvação dos teus concidadãos!
Mas, se há algum medo de cair em desagrado, dever-se-á, porventura, ter mais receio da antipatia motivada pelo rigor e pela fortaleza que pela preguiça e pelo desleixo? Ou, quando a Itália for devastada pela guerra, quando as cidades forem arrasadas, quando as casas estiverem a arder, acaso pensas tu que nessa altura não hás-de ser inteiramente devorado pelo fogo do ódio popular?"
XII
A estes tão augustos clamores da República e ao pensamento daqueles homens que sentem desse mesmo modo responderei em poucas palavras. Se eu, venerandos senadores, considerasse que a melhor atitude era castigar Catilina com a morte, não concederia a esse gladiador nem mais uma hora de vida. É que, se homens da mais alta categoria e cidadãos dos mais ilustres não só se não mancharam, mas até colheram honra no sangue de Saturnino, e dos Gracos, e de Flaco, e de muitos ainda mais antigos, certamente eu não teria que recear que, com a morte deste parricida dos seus concidadãos, sobre mim se derramasse qualquer ódio da posteridade. E, mesmo que este me estivesse particularmente iminente, sempre tive, apesar disso, a convicção de que o ódio alcançado pelo mérito não é ódio, é glória.
Há, todavia, nesta Ordem de senadores, alguns que, ou não vêem aquilo que nos ameaça, ou fingem ignorar aquilo que vêem; estes, pela moleza das suas decisões, alimentaram a esperança de Catilina e deram força à conjuração nascente, não acreditando nela; e, por sua influência, muitos; não apenas os perversos, mas ainda os mal informados, diriam, se eu tivesse punido Catilina, que o tinha feito com crueldade e tirania.
Ora eu penso que, se este der entrada nos acampamentos de Mânlio, que são o seu objectivo, não haverá ninguém tão ingénuo que não veja ter-se armado uma conjuração, ninguém tão descarado que o não confesse. Por outro lado, penso que, se for condenado à morte apenas Catilina aqui presente, este flagelo que afecta o Estado pode reprimir-se por um pouco, não suprimir sem para sempre. Mas, se ele se desterrar a si mesmo e levar os seus partidários consigo, e se recolher, de toda a parte, os demais naufragados da vida e os congregar no mesmo lugar, ficará extinta e debelada não apenas esta já tão adiantada doença do Estado, mas até a raiz e o germe de todos os males.
XIII
É que nós, venerandos senadores, vivemos desde há muito envolvidos nestes perigos e nas ciladas de uma conspiração, mas, não sei como, a maturação de todos os crimes e da antiga loucura e audácia veio a rebentar no tempo do nosso consulado. E se, de tamanho bando de salteadores, se suprimir apenas este, poderá parecer talvez que ficamos, por um pequeno espaço de tempo, aliviados da apreensão e do medo; o perigo, porém, há-de permanecer e ficará profundamente inculcado nas veias e nas entranhas da República. Tal como, muitas vezes, as pessoas atingidas por uma doença grave, se, no tumultuar do ardor da febre, beberam água gelada, parecem aliviadas nos primeiros momentos e logo depois o mal as oprime mais forte e violento, do mesmo modo esta doença que existe no seio do Estado. aliviada embora pelo suplício daquele que ali vedes, agravar-se-á com mais violência ainda se sobreviverem os restantes conjurados.
Por tudo isto, que os perversos se retirem, se separem dos homens de bem, se juntem num só lugar e que uma muralha, enfim, como já o proclamei tantas vezes, os mantenha separados de nós; que deixem de armar traições ao cônsul na sua própria casa, de bloquear o tribunal do pretor urbano, de assediar com armas a Cúria, de preparar dardos incendiários e archotes para deitar fogo à cidade; numa palavra, que na fronte de cada um se mostrem gravados os seus sentimentos políticos. Garanto-vos, senadores egrégios, que a nossa vigilância de cônsules há-de ser bastante, e espero que haja em vós tal autoridade, nos cavaleiros romanos tamanha coragem, em todos os homens de bem a conformidade de sentimentos necessária para poderdes ver que, com a retirada de Catilina, tudo fica descoberto, esclarecido, subjugado, punido.
Com estes presságios, Catilina, e para suprema salvação do Estado, para tua desgraça e ruína e para perdição daqueles que a ti se ligaram por toda a espécie de crimes e parricídios, parte para essa guerra ímpia e nefanda. E tu, Júpiter, cujo culto foi estatuído por Rómulo sob os mesmos auspícios, desta cidade, tu a quem com justiça chamamos o Sustentáculo desta urbe e deste império, hás-de relegar este assassino e os seus comparsas para longe do teu templo e dos restantes, das casas de Roma e das suas muralhas, da vida e dos haveres de toda a população; e àqueles que odeiam os homens de bem, aos inimigos da Pátria, aos salteadores da Itália, unidos entre si por um pacto criminoso e uma aliança nefanda, a esses, vivos e mortos, hás-de puni-los com suplícios eternos.
quinta-feira, outubro 04, 2007
Francisco de Assis
04/10
São Francisco de Assis
São Francisco de Assis nasceu na cidade de Assis, na Itália, em 1181. Filho de um rico comerciante de tecidos, Francisco Bernardone, nome de batismo, tirou todos os proveitos de sua condição social vivendo entre os amigos boêmios. Tentou como o pai, seguir a carreira de comerciante, mas a tentativa foi em vão.
Sonhou então, com as honras militares. Aos vinte anos, alistou-se no exército de Gualtieri de Brienne que combatia pelo papa, mas em Spoleto teve um sonho revelador. Foi convidado a trabalhar para “o Patrão e, não para o servo”.
Suas revelações não parariam por aí. Em Assis, o santo dedicou-se ao serviço de doentes e pobres. Um dia do outono de 1205, enquanto rezava na igrejinha de São Damião, ouviu a imagem de Cristo lhe dizer: “Francisco, restaura minha casa decadente”.
O chamado, ainda pouco claro para São Francisco, foi tomado no sentido literal e o santo vendeu as mercadorias da loja do pai para restaurar a igrejinha. Como resultado, o pai de São Francisco, indignado com o ocorrido, deserdou-o
Com a renúncia definitiva aos bens materiais paternos, São Francisco deu início à sua vida religiosa, “unindo-se à Irmã Pobreza”.
O Ordem dos Frades Menores teve início com a autorização do papa Inocêncio III à Francisco e onze companheiros de tornarem-se pregadores itinerantes, levando cristo ao povo com simplicidade e humildade.
O trabalho foi tão bem realizado que, por toda a Itália, os irmãos chamavam o povo à fé e à penitência. A sede da Ordem, localizada na capela de Ponciúncula de Santa Maria dos Anjos, próxima à Assis, estava superlotada de candidatos ao sacerdócio. Para suprir a necessidade do espaço, foi aberto outro convento em Bolonha.
Um fato interessante entre os pregadores itinerantes foi que poucos, dentre eles, tomaram as ordens sacras. São Francisco de Assis, por exemplo, nunca foi sacerdote.
Em 1212, São Francisco fundou com sua fiel amiga Santa Clara, a Ordem das Damas Pobres ou Clarissas.
Já em 1217, o movimento franciscano começou a se desenvolver como uma ordem religiosa. E como já havia ocorrido anteriormente, o número de membros era tão grande que foi necessária a criação de províncias que se encaminharam por toda a Itália e para fora dela, chegando inclusive à Inglaterra.
Por um momento da história, Francisco renunciou à liderança da ordem e, em sua ausência, os irmãos criaram algumas inovações.
Apoiado pelo amigo cardeal Ugolino, em 1221, São Francisco de Assis apresentou uma versão revisada de sua regra de Pobreza, Humildade e Liberdade evangélica e, após feitas algumas modificações a regra foi aprovada.
A devoção a Deus não se resumiria em sacrifícios, mas também em dores e chagas. Enquanto pregava no Monte Alverne, nos Apeninos, em 1224, apareceram-lhe no corpo as cinco chagas de Cristo, no fenômeno denominado “estigmatização”.
Os estigmas não só lhe apareciam no corpo, como foram sua grande fonte de fraqueza física e, dois anos após o fenômeno, São Francisco de Assis foi chamado ao Reino dos Céus.
Autor do Cântico do Irmão Sol, considerado um poeta e amante da natureza, São Francisco foi canonizado dois anos após sua morte. Em 1939, o papa Pio XII tributou um reconhecimento oficial ao “mais italiano dos santos e mais santo dos italianos”, proclamando-o padroeiro da Itália.
(Fonte: Site do Pe.Marcelo Rossi)
São Francisco de Assis
São Francisco de Assis nasceu na cidade de Assis, na Itália, em 1181. Filho de um rico comerciante de tecidos, Francisco Bernardone, nome de batismo, tirou todos os proveitos de sua condição social vivendo entre os amigos boêmios. Tentou como o pai, seguir a carreira de comerciante, mas a tentativa foi em vão.
Sonhou então, com as honras militares. Aos vinte anos, alistou-se no exército de Gualtieri de Brienne que combatia pelo papa, mas em Spoleto teve um sonho revelador. Foi convidado a trabalhar para “o Patrão e, não para o servo”.
Suas revelações não parariam por aí. Em Assis, o santo dedicou-se ao serviço de doentes e pobres. Um dia do outono de 1205, enquanto rezava na igrejinha de São Damião, ouviu a imagem de Cristo lhe dizer: “Francisco, restaura minha casa decadente”.
O chamado, ainda pouco claro para São Francisco, foi tomado no sentido literal e o santo vendeu as mercadorias da loja do pai para restaurar a igrejinha. Como resultado, o pai de São Francisco, indignado com o ocorrido, deserdou-o
Com a renúncia definitiva aos bens materiais paternos, São Francisco deu início à sua vida religiosa, “unindo-se à Irmã Pobreza”.
O Ordem dos Frades Menores teve início com a autorização do papa Inocêncio III à Francisco e onze companheiros de tornarem-se pregadores itinerantes, levando cristo ao povo com simplicidade e humildade.
O trabalho foi tão bem realizado que, por toda a Itália, os irmãos chamavam o povo à fé e à penitência. A sede da Ordem, localizada na capela de Ponciúncula de Santa Maria dos Anjos, próxima à Assis, estava superlotada de candidatos ao sacerdócio. Para suprir a necessidade do espaço, foi aberto outro convento em Bolonha.
Um fato interessante entre os pregadores itinerantes foi que poucos, dentre eles, tomaram as ordens sacras. São Francisco de Assis, por exemplo, nunca foi sacerdote.
Em 1212, São Francisco fundou com sua fiel amiga Santa Clara, a Ordem das Damas Pobres ou Clarissas.
Já em 1217, o movimento franciscano começou a se desenvolver como uma ordem religiosa. E como já havia ocorrido anteriormente, o número de membros era tão grande que foi necessária a criação de províncias que se encaminharam por toda a Itália e para fora dela, chegando inclusive à Inglaterra.
Por um momento da história, Francisco renunciou à liderança da ordem e, em sua ausência, os irmãos criaram algumas inovações.
Apoiado pelo amigo cardeal Ugolino, em 1221, São Francisco de Assis apresentou uma versão revisada de sua regra de Pobreza, Humildade e Liberdade evangélica e, após feitas algumas modificações a regra foi aprovada.
A devoção a Deus não se resumiria em sacrifícios, mas também em dores e chagas. Enquanto pregava no Monte Alverne, nos Apeninos, em 1224, apareceram-lhe no corpo as cinco chagas de Cristo, no fenômeno denominado “estigmatização”.
Os estigmas não só lhe apareciam no corpo, como foram sua grande fonte de fraqueza física e, dois anos após o fenômeno, São Francisco de Assis foi chamado ao Reino dos Céus.
Autor do Cântico do Irmão Sol, considerado um poeta e amante da natureza, São Francisco foi canonizado dois anos após sua morte. Em 1939, o papa Pio XII tributou um reconhecimento oficial ao “mais italiano dos santos e mais santo dos italianos”, proclamando-o padroeiro da Itália.
(Fonte: Site do Pe.Marcelo Rossi)
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